sexta-feira, 30 de julho de 2010

Quem Planta Cana em Ladeira - (20) laboratório.

De uma antiga história da cultura do açúcar.
XX
O moleque que trouxe o café da manhã disse que hoje é sábado. Puxei na conversa. O menino tem medo, fala pouco. Pedi que ficasse enquanto comia, fazendo companhia. Ficou desconfiado. Perguntei por Amaro, que vivia pras bandas da cidade, trazendo as encomendas do Wanderley, meu genro. Que o homem acabou de construir um barracão, distante da prensa velha, pé-direito alto, um mundo de construção. Não sabe direito, estão falando em uma moenda movida a vapor, feito trem. É o fim do mundo. Veja a necessidade de trocar a roda d’água, o boi de roda por uma invenção dessas? Quanta cana esse infeliz pensa em moer? Deus me livre. Vai acabar com a produção dos engenhos pequenos da região e comer o restinho das matas.
Zefinha veio buscar o moleque. “É para levar um recado de Donana,” disse, sei que é para cessar prosa. Pode ser, trabalho de menino é pouco, mas quem rejeita é louco. Sinhá não quer é que me passem relatos para agravar o meu nervoso. Sabe de uma coisa? Certas coisas arrependo-me até de ficar sabendo. Quero saber, depois não quero.
Coisa de gente velha.
Acho.
Melhor nem comentar com Donana o que Damião falou, é capaz de proibir. Coitado do negrinho - esse nasceu forro -, pena sempre tive dos cativos. Não podia era dizer, até hoje não digo, nunca vi certo castigá-los. Castiguei, foi o jeito, mas não gostava. Tenho vontade de pegar esse negrinho no beliscão até ele desembuchar tudo que sabe. Tenho dó, nunca fiz com gosto, não agora. Meu pai dizia que o castigo às vezes era preciso, tem negro viciado. Nas terras do senhor Justino tinha um que só trabalhava depois que levava uma pisa. Um dia o senhor atendendo ao pedido de um padre para não bater tanto no escravo, dispensou a sova diária. Chegou à lavoura o cativo estava parado, encostado na estrovenga. Perguntou por que não estava trabalhando, o homem respondeu que esperava os açoites de costume para depois começar na lida.
Se hoje é sábado amanhã é o batizado do menino. Mas, não ouço o barulho da cozinha. Será que Sinhá contou direito dessa festa. Começou, começou tentando que eu me levantasse, vestisse, fosse ver o batismo do menino. Não completou a frase. Fiz careta e balancei a cabeça. Daqui ninguém me tira.

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