sábado, 29 de agosto de 2009
Quem Planta Cana em Ladeira 10 - (laboratório)
Esboço de uma tentativa de romance em capítulos curtos de uma velha história da cultura do açucar
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Conhecer bem não conhecia, as referências foram boas. Donana disse, ajeitando, “com Jesus deu certo, e a família não era desconhecida?” Só porque da mata norte? Desconhecida para ela. Conheço muito bem, aparentados com o meu avô. E não veio de lá o pai do meu pai? Contava que mudou por uma vergonha que passou. Acertou com o presidente da província para abrir um trecho de estrada, fio de bigode em garantia, que em três meses entregava pronta. Nesse ano o inverno foi pesado o primeiro mês choveu o encomendado para o ano todo, meu avô teve muita dificuldade, os homens abriam a picada, batiam o barro e a chuva desmanchava, dobrou os trabalhadores, mandou buscar carroças, ferramentas, não teve jeito, a obra não rendia. Saibro batido, saibro lavado. Meu avô apertava os cativos, na derrubada das matas perdeu mais de trinta homens, dos sucedidos acidentes com os paus, de picada de cobra, fora os que aproveitavam para largar. Não deu. A empreitada levou quatro meses e dezessete dias. O Senhor meu avô prestou contas ao presidente, não quis receber nada, de vergonha. Vendeu tudo, terra, casa, cativos, deu quase de graça, mudou-se, vexado por não ter cumprido o prazo ajustado. Botou a mulher, as crianças e as tralhas em treze bestas e em quatro carroções. Saiu sem saber direito para onde ia, acabou aqui na sul, com muita dificuldade, chegou a vender arreios na feira de Camela para ajudar na renda. Comprou uma terrinha, foi aumentando, prosperando, meu pai pegou as terras do engenho quase já na forma hoje. Aumentado, próspero. Fiquei com o engenho principal, comprou muita terra, longe, perto, todos os meus irmãos começaram com um bom pedaço. As meninas tiveram bom dote. Chico vendeu as dele e foi ser Doutor na corte, é gosto, o engenho, tinha uma várzea grande, terra plana, dava na beira da praia com duas fazendas de coco. Vale pouco, o cultivo não dá muito trabalho, é só ter gente para desbastar os pés. As terras da beirada d’água é que ninguém quis. Um banho salgado me fazia bem, um ou outro. Minha mãe gostava, ordem do médico, trinta banhos salgados por verão. Morar perto daquela friagem, vento de maresia, isso não é para gente, é coisa de caranguejo.
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